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segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Caprichos



Porque alguém me lembrou que eu devia voltar a falar de amor, trago-vos este conto.


- Pede um desejo!
- Sério? Tudo o que eu quiser?
- Acho que sim... arrisca!
O amor leva-nos a fazer as coisas mais loucas. Como por exemplo...
Ele sabe das minhas paixões, inexplicáveis. Por objectos simples e banais e por pedras, paus, cacos... mas nunca pensei que se propusesse a realizar-me as mais doidas fantasias.

Era um sábado de manhã. Na Afurada, acontecia um mercado de rua. Feirantes gritavam aos ventos convidando à visita e ao consumo. Miúdos e miúdas corriam, em torno das tendas e bancadas, disputando gargalhadas e traquinices. As saias das mães, não paravam quietas de tanto serem puxadas.
- Mãe, quero algodão doce...
- Mãe...
- Mãeee...
As gaivotas, metediças, vinham-se juntar à gritaria esganiçada que pairava no ar, espalhando guinchos com sabor a mar e rio.
Foi neste ambiente de quase folia e excitação que ele se encontrou comigo.
Combinamos às 10. Ele pontual, eu nem por isso. Mas o sorriso que eu lhe oferecia, perdoava a minha falta. Porque ele era a generosidade em pessoa e o meu melhor amigo.
Percorremos a pequena feira à procura de excentricidades e banalidades. Ele ria o tempo todo. Eu perguntava-me porquê.
A certa altura deteve-se e disse-me:
- Escolhe.
- Escolho?? O quê?
- O que quiseres. A coisa mais louca que me quiseres pedir, será tua.
- Mas, porquê?
- Simplesmente por gozo. Porque te quero fazer rir.
A partir daí, não soube de mais nada. Fechei os olhos, rodopiei sobre os calcanhares, de indicador em riste e quando parei de girar, esperei que ele me desse um sinal do que tinha sido a minha escolha.
Só ouvi dizer:
- Está bem! Escolheste. Está escolhido.
Eu não queria acreditar no que os meus olhos viam... ele pagou a sua volumosa encomenda. Transportou-a até ao carro, com dificuldade, debaixo do meu ar incrédulo e com um beijo atirado ao ar que nem sei onde foi parar, disse:

- É para ti.

Ainda hoje, revejo com saudade e nostalgia, as enormes loucuras que constantemente fazíamos, os deliciosos momentos que passamos, oferecendo prazeres e afins, um ao outro.
Tudo em nome do amor. Tudo porque nos amamos de paixão e sorvíamos cada pedacinho de ar que o outro expirava. Nada era deixado ao acaso ou perdido no tempo, no nosso quotidiano. Porque não há amor como o verdadeiro, sabíamos que o único pacto que seláramos, era o compromisso de sermos tão amigos, tão irmãos, tão felizes, que não havia limites no nosso horizonte.

Durante anos, não comprei um único chapéu de chuva.

Afinal, não é todos os dias que uma rapariga recebe de presente todos os chapéus de chuva que existem à venda numa num mercado de rua.

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